segunda-feira, 21 de março de 2016

Muita Coisa Inacabada Porque a Gente Acabou - Part II

“Essa garota me engole enquanto beija, pressiona o corpo com força nas minhas pernas quase abertas, coloca minhas mãos na cintura dela, fica claro que ela está transando comigo; o rádio toca uma dessas musicas moderninhas que não são nada autênticas, meus olhos estão abertos, os dela estão bem fechados, chega a ser ridículo a força que ela coloca nas pálpebras, concluo que eu não estou transando com essa garota, mas sei mentir bem. O celular toca, é a minha mãe, a garota quer que eu dê atenção somente a ela, mal sabe que não presto atenção nela desde sua declaração horrenda sobre odiar Jazz e cantores negros. É um puto defeito, consigo me desencantar em segundos. “Espera aí mãe, me deixa finalizar essa menininha.” As semanas seguintes são essenciais para que tudo vá por água a baixo, ela me chama de canalha, patife, escroto filho da puta, frio, e ainda diz que sou bloqueado emocionalmente. Ainda bem. Sei que tudo está acabado quando ela me envia aquela SMS: ESPERO QUE VOCÊ SEJA BEM INFELIZ, ANIMAL, ESTUPIDO… (e blá blá blá). Fora tudo isso, eu até que sou um cara legal, gosto dessas camisetas de um bolso só, tênis azul marinho, musicas dos anos 80 e sei cozinhar frutos do mar como ninguém. Também vou à igreja sempre que posso, “perdão padre, pequei feio esse final de semana, falei para ela que a amava só pra foder mesmo” Ele da aquela bufada pesarosa e me manda rezar alguns Ave marias. No sábado seguinte esqueço as rezas e os conselhos da minha mãe, vou com tudo, não me ache um escroto, mas não há nada como beijar e apalpar uma garota no sofá, bêbado até o talo. Todo mundo está vendo, até que ela pede pra gente procurar um lugar mais calmo, coloco minha mão dentro da calcinha molhada dela e a encosto na parede, me sinto super machão, até que ela toca na minha orelha e… Acabou garota, preciso mesmo ir pra casa, alimentar meu cachorro. Ela não deixa, e se esfrega no meu corpo indiferente, se abaixa, tira minhas calças e diz que adora o meu gosto, reviro os olhos, acho super golpe baixo fazer um boquete em um cara que está com a cabeça longe. E está mesmo, sempre no mundo da lua, ou na lua do mundo! No caminho de volta, coloco aquele pendrive com aquelas musicas antigas, e é a primeira vez em seis meses que lembro que tenho lembrado de você, juro que não quero dizer como até o tempo abafado tem o seu gosto, minhas canelas enfraquecem, minhas mãos deslizam no volante, mal consigo trocar as marchas. Meu cérebro remete as coisas permanentes, sólidas, seguras, coisas que não tem absolutamente nada a ver com seu jeito desajeitado de viver. Essas imagens vêm em seguida: Domingos regados a cerveja com meu cunhado, jogar bola com meus sobrinhos, ler para minha mãe, cozinhar a sobremesa que a família acha ser uma tradição. Como são insuportáveis as tradições. Me sinto estagnado, fora do tempo. Ligo para a Laura, falo mundos e fundos de coisas românticas já programadas, e cá estou eu, ensopado de cachaça enquanto essa mulher tira minha roupa, ela elogia minha barba, e goza, faz isso porque se entrega, ela se abre todinha para mim, e eu não consigo digerir o fato de alguém se entregar dessa maneira pra mim, detesto ter que segurar qualquer coisa por mais de dez segundos. Os dias vão e vão e vão - domingos, festas, trabalho feito um animal pra manter a pose de homem comprometido com as coisas realmente importantes da vida. Esse calor me mata, me irrito, porque sou tão verdadeiro nas palavras, e tão filho da puta nas ações. Até que gosto do cabelo enroladinho dela, da boca sensual da outra, dos braços fortes daquela loirinha que conheci não sei aonde, mas tenho tanta preguiça de gostar de qualquer outra coisa. De confiar e passar por todo esse processo montanha-russa. Então viajo com minha mãe, carrego toda a maconha que posso, meus DVDs e um dos livros que alguém me indicou. Prefiro ficar bem longe do mundão, e esse desejo não sai de mim, de viajar até mil novecentos e antigamente, até a época em que a gente nem sabe como eram as coisas nessa época. Faço uma fogueira e tomo uma cerveja com minha coroa, estamos ouvindo aquelas musicas que são só guitarra e uma bateria sem pratos, me sinto quase um velho em uma cadeira de balanço. É claro que tento esconder meu descontentamento com o mundo, mas é madrugada e eu sou tão meninão, vou dormir com minha mãe, ela me abraça e faz um carinho gostoso no meu cabelo, e é a primeira vez desde você que eu me sinto completamente seguro perto de alguém. Peço baixinho que ela me deixe voltar para o calor do útero dela, e escuto aquela risadinha pura de quem já viveu muito, de quem sabe das coisas. Tenho plena convicção da minha necessidade de ser amado, tanto quanto sinto fome e sede. Vou correr, quero achar o lugar onde a gente se perdeu, quem sabe você deixou um rastro por lá, tento me manter otimista, não custa nada ter um pouco de fé de vez em quando. Paro pra ouvir as coisas dentro de mim, e é tão drasticamente belo que você com todas suas paranóias e utopias fantasiosas demais, consiga me expor dessa maneira, como se desmontasse meu corpo, nervo por nervo, até não restar nada que eu consiga ouvir além de você. Me apavora essas três palavrinhas, prefiro dizer “vá a merda” é mais fácil, seguro e não vai dar trabalho algum depois. Me arrependo, porque se você for realmente a merda, quem vai ficar para iluminar os lugares? Sei que hoje você me vê como um maluco qualquer que não tem paladar para o amor, e você está certa, detesto tanto que você esteja certa sobre tantas outras coisas, detesto que você seja tão de verdade que me faça acreditar que todo o resto seja de mentira. Até me assusta, que você seja tão errada, diferente dessas outras garotas com quem eu transo, que parecem terem sido criadas por um computador, se encaixam perfeitamente nesse mundo preto e branco, estereotipado, e acho que por isso não encontro rastros seus, você não pertence a esse lugar, não é daqui. Aqui onde estou é gélido, e é tão quente quanto uma compressa que queima a pele. Quero atirar pedras nas coisas, porque odeio esse mundo, que nos moldou tão perfeitamente um para o outro e esqueceu de tirar a porra da insegurança, o tempo, o medo e todas essas milhões de coisas que me fazem estar aqui correndo nessa estrada barrenta, ao invés de estar aí transando e fazendo amor com você ao mesmo tempo, no mesmo lugar, aliás me fala onde fica esse lugar.”

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